ESTADO E MODERNIZAÇÃO TERRITORIAL EM GOIÁS - Júlio César Pereira Borges

20/01/2012 12:00

 

O texto que se apresenta tem como objetivo promover uma rápida discussão sobre a atuação do Estado, através das políticas territoriais na modernização do território goiano, que teve início na década de 1930, se consolidou na década 1970 e se estende até a atualidade.

Nesse período o Estado Nacional alinhado ao Estado Local desenvolveu políticas para preparar o território visando construir a modernização do mesmo.  Observa-se que esse processo tem uma condução externa: o Brasil rural é sinalização do atraso. Urbanizar é elevar-se ao patamar da racionalidade desenvolvida e de progresso dos países ricos. Modernizar é o instrumento de fazer do território o palco do progresso. A política territorial é o veículo concreto, financeiro, ideológico que põe máquinas, fios e políticas para desenvolver a aproximação entre os lugares e o mundo capitalista.

Está em debate, portanto, o modo como à acumulação simples organiza o território e o usa. Esse modo é visto no cenário da acumulação capitalista como o “palco do atraso”. O Estado é este ente político que propõe mudanças nesse uso, criando condições para a acumulação liberal. A rentabilidade da acumulação simples é lenta, compartilhada, ligada apenas à produção da existência. A rentabilidade liberal deve ser inteligente, planejada, calculada e individualista.

Considera-se que não se trata de opor tradição e modernização, no sentido de afirmar que o território da acumulação simples era organizado para a vida e para o acesso de todos - isso não é verdadeiro. O camponês não conhecia a escola, não tinha acesso à medicina, suas condições de moradia e de alimentação eram precárias, a mortalidade infantil era gigante e havia uma subjetividade patronal e machista que conduzia as relações de afeto e de ligação. Todavia, a modernização desigual manietada pelo capital e conduzida pelo Estado a partir da política territorial, recria o latifúndio, concentra renda, dispersa os regimes de cooperação, fragmenta os sujeitos e cria uma cultura e uma subjetividade distante da vida. Como se vê o ponto nevrálgico é o modelo de modernização e a quem beneficia. Isso impõe pensar o sentido ideológico e político do Estado e das políticas territoriais.

Nesse sentido, o Estado é um representante político de classe que se consolida a partir da política territorial. O Estado só age sobre o território a partir da política, mas essa ação leva consigo a sua condição de classe. Portanto, ao desenvolver a política imaginando ser pública, transforma-a num componente ideológico, pois esconde a sua condição de classe.

Pode-se dizer, por exemplo, que a modernização do território pela via da política pública traz consigo a pertinência desse Estado: a vontade de criar o Estado burguês e de transformar o território goiano numa arena territorial de rentabilidade capitalista. Por isso, partimos da idéia de que não há uma separação entre o Estado e a política pública, pois o Estado é o feixe abstrato de instituições, de órgãos, de autarquias, de ideologias e imaginários, e a política pública concretiza o sentido de ação.

Entende-se também que o sujeito contemporâneo que reside em Goiás, envolto pela sua ação de trabalho, pelo modo como se insere no espaço urbano ou rural, pela sua ligação com instituições (como a escola), pelo seu contato com o mundo pela via do telefone, da internet, da comunicação, pelos diferentes hábitos que possui, por exemplo, entre o goiano do Norte e o goiano do Sul, sofre uma ação de gestão feita pelo Estado.

Essa ação de gestão é incrementada e concretizada como uma política que age concreta e ideologicamente nos diferentes lugares, aproveitando infra-estrutura, portes demográficos, condições físicas do relevo e do solo. É a política pública, portanto, que age para a realização da modernização do território goiano através da estratégia logística dos interesses dos atores econômicos que hegemonizam o capital e a política.  E isso inclui mudanças nas bases culturais do sujeito em sua visão de mundo e, especialmente, em suas demandas por objetos e mercadorias.

Nessa transmutação, da passagem de um Goiás da troca simples para um Goiás da troca acumulada, a transferência de uma população da vida rural para a vida urbana coloca em cena a mudança da cultura goiana. Por conta disso defendemos que a modernização do território goiano inclui as mudanças culturais, a alma do sertanejo, seus gostos, seus valores, mudanças de hábitos, de lazer, etc e a inclusão também de novas doenças, novas perturbações e novas demandas.

Entende-se então, que o uso do território tem ligação efetiva com a política pública e com o seu cerne: o Estado. E está em curso um rol de impactos que reconstituem as contradições sociais de quem aqui reside. Essas contradições entram na vida, no morar, no comer, no trabalhar e no sonhar do sujeito que reside em Goiás.

 

Júlio César Pereira Borges
Professor do curso de Geografia da Universidade Estadual de Goiás – UNU Iporá e
doutorando pelo Instituto de Estudos Socioambientais da Universidade Federal de Goiás
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