VER O REAL: PEDRINHAS NO LAGO – Eguimar Felício Chaveiro

10/10/2012 12:00

 

Pedrinhas lançadas no lago exercem pulos escorregadios e simétricos na superfície da lâmina d ´água. Ao criarem um efeito de acrobacia é comum pai e filho, em total comunhão, dedicarem-se ao lazer experimentando “situações físicas complexas”, ao que tem sido denominado “física das pequenas causas”. E esse fenômeno, como outros de portes invisíveis, não está separado dos maiores classificados como pertencentes a macrofísica, como, por exemplo, a lei gravitacional, arquiteta do universo.

Por que as pedrinhas dançam na água? – pergunta o filho ao pai. O baile contínuo das pedrinhas envolve várias dimensões: o volume e a massa da pedrinha; o tamanho; a força muscular de quem a joga; a distância; o tempo e o espaço; a gravidade; a direção do vento; e a gratuidade do coração no gesto paterno; o contato do sólido com o líquido em velocidade; a troca entre matéria e energia; o alcance do efeito criado – e posteriormente e misteriosamente a ação da pedrinha e ação da água – e de seus elementos no assoalho do lago.

O fenômeno põe em cena dimensões da ação de sujeitos – pai e filho; elementos químicos e biológicos; elementos físicos como dimensões interiores, o que os olhos não podem controlar. Ou o que a mente, fundamentada num longo caminho filosófico, poderia alcunhar de “fluência das potências abertas”, a vida como dado do tempo e do espaço, mas também como possibilidade; como condicionamento pois subtrai o passado, mas como incerteza porque age no futuro.

Jogar pedrinhas na água e metaforizar a vida humana coincide com o que o Astrofísico Marcelo Gleiser pontua: “de fato o homem é um ser improvável, existe na vastidão do universo, é apenas uma minúscula fagulha, mas pode transformar o improvável num apanágio de verdades, as mais estranhas e maravilhosas”.

Com a consciência ou com a subjetividade, para o ser humano, jogar pedrinha na água  pode ser simples: apenas um gesto cultural marcado pelo afeto de um pai por um filho. Todavia, o que é anterior  a esta ação não é simples: este pai e este filho no lazer lacustre estão ligados a outros desejos; existem numa trama visceral da vida, como, por exemplo, o processo de reprodução, possuem laços genéticos; são coordenados por uma vida social que lhe institui a economia, a política, a moral, a ética.  E daí costumes, hábitos, gostos etc.

Agem com emoção e não se repetem em nenhum outro entre quase 7 (sete) bilhões de pessoas. Na sua extrema singularidade pode ser alienado, subordinado, classificado como pedreiro, professor, carpinteiro, vendedor de enxoval...sua vida liga-se à história e por ela é que age; está ligada ao espaço e por ele age; tem o poder irredutível de transformar-se e de agir. Precisa dos valores, dos saberes, da percepção para dizer o que É e para representar o mundo, para nomear os conflitos e elucidá-los. Possui as dores de desejar sempre e instalar-se na força do inacabamento; nunca se realiza por inteiro, mas fabrica o próprio fim, pois é alimento do tempo; é matéria total finita e possui a faculdade de transgredir.

Classifica as coisas, e, por um instante senta na poltrana do garbo e  não tem o segredo na sua vasta interioridade; pergunta de onde veio e só sabe ao certo para onde vai: a morte; tenta vencê-la com a linguagem, com a memória, com a significação. Inventa deuses, mas pode ser objeto de  vinculações terrenas como o poder institucional das igrejas, das lideranças religiosas ou da ideologia que o afasta da realidade.... convém jogar pedrinhas no lago. Convém perguntar: o que envolve jogar pedrinhas no lago? Eis o método.

 

Eguimar Felício  Chaveiro
Professor Associado do IESA/UFG
Membro da Academia Trindadense de Letras

eguimar@hotmail.com

 

 


 


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