VERSOS BANGUELOS - Sinvaline Pinheiro
Cléa ficou viúva muito nova, aos 28 anos, com dois filhos , desempregada, a situação não era das melhores.
Falta isso, falta aquilo e o dinheiro que ganhava lavando roupa mal dava para comer.
Vizinho atento, seu João prestava atenção na vida de Cléa. Mas como se aproximar? homem visitando casa de viúva dava no que falar...
Começou presenteando as crianças, foi chegando devagarzinho até que se tornou rotina as visitas noturnas.
O coração surpreendeu seu João, aos 68 anos batendo forte ante a proximidade com Cléa.
Pesquisou sua velha biblioteca, lhe levou livros com historias de amor, lia em voz alta até que ela cochilava sentada na cadeira e ele sorrateiramente ia embora.
Os meninos peraltas se aproveitavam da situação para ganhar presentes.
Uma noite, seu João veio mais inspirado, trouxe versos de Camões e em posição de orador, começou a ler o poema em voz alta.
Cléa ouvia atenta, as crianças foram se aproximando e quando estavam bem debaixo do queixo do seu João gritaram:
- Olha mãe!..
- Psiu, quieta menino! Disse Cléa
- Maein.. mãe, seu João só tem um dente em cima e um em baixo...
O orador foi baixando o papel, saiu cabisbaixo, uma ultima olhada para a casa, seus versos banguelos não cabiam mais ali...
Escritora e natural de Uruaçu GO. Tem livros de
poemas publicados pela Kelps e de causos pela Puc-GO.